Do The New York Times
- Os exercícios estimulam o processo de autofagia das células, melhorando o metabolismo
Ao destacar os benefícios da atividade física, poucos de nós incluiriam
a "faxina" intracelular. Contudo, um novo estudo sugere que a
capacidade dos exercícios físicos de acelerar a remoção de resíduos e
reciclagem dos componentes aproveitáveis das células do corpo pode ser
um de seus efeitos mais importantes, ainda que o menos visível.
Na nova pesquisa, publicada mês passado na revista Nature,
cientistas do Centro Médico do Sudoeste na Universidade do Texas, em
Dallas, uniram dois grupos de camundongos. Um era normal, possuindo um
sistema de limpeza celular apurado. O outro tinha sido reproduzido com
sistemas de eliminação de resíduos enfraquecidos.
Sabe-se, há muito tempo, que as células acumulam resíduos do desgaste
da vida cotidiana. Dentro da célula há uma espécie de amontoado de
dejetos formado de proteínas quebradas, fragmentos de membranas
celulares, bactérias ou vírus invasores e componentes celulares gastos
ou decompostos.
Na maioria das vezes, as células eliminam esses dejetos. Elas até os
reciclam para obter energia. Através do processo de autofagia, ou
autodigestão, as células criam membranas especializadas que ingerem os
dejetos presentes no citoplasma e os levam para uma região da célula
denominada lisossomo, onde os resíduos são quebrados e queimados para
obtenção de energia.
Sem esse sistema eficaz, as células poderiam ficar sufocadas e não
funcionar bem ou morrer. Nos últimos anos, alguns cientistas começaram a
suspeitar que mecanismos de autofagia falhos contribuíssem para o
desenvolvimento de diversas doenças, incluindo diabetes, distrofia
muscular, mal de Alzheimer e câncer. Acredita-se que a desaceleração da
autofagia na meia-idade também exerça um papel no envelhecimento.
Autofagia
A maioria dos pesquisadores acredita que o desenvolvimento do processo
foi uma reação ao estresse da inanição: a célula passaria a reunir e
consumir partes supérfluas de si própria para manter vivas as partes
importantes. Em placas de Petri, a taxa de autofagia aumenta quando as
células estão famintas ou são colocadas sob outra forma de estresse
fisiológico.
O exercício físico certamente consiste em um estresse fisiológico.
Contudo, até recentemente, poucos pesquisadores haviam indagado se o
exercício físico poderia de alguma forma afetar a taxa de autofagia e,
caso afetasse, se isso seria importante para o corpo de modo geral.
"A autofagia afeta o metabolismo e possui benefícios abrangentes para o
corpo relacionados à saúde", afirmou Beth Levine, pesquisadora do
Instituto Médico Howard Hughes no Centro Médico do Sudoeste. "Parecia
haver consideráveis elementos em comum." Porém, não estava claro como os
dois interagiram, acrescentou Levine.
Assim, ela e seus colegas colocaram em ação camundongos de laboratório.
Os animais haviam passado por um tratamento para que as membranas
envolvidas na autofagia brilhassem, revelando-se. Após 30 minutos
apenas, os cientistas descobriram que os camundongos tinham uma
quantidade significativamente maior de membranas nas células do corpo
todo, o que indicava uma autofagia acelerada.
Contudo, essa descoberta não explicava o significado do aumento da
limpeza celular para o bem-estar dos camundongos. Por isso, os
pesquisadores desenvolveram uma linhagem de camundongos cujos níveis de
autofagia permaneciam constantes mesmo se eles estivessem famintos ou
vigorosamente exercitados.
Em seguida, os pesquisadores fizeram com que esses camundongos
corressem lado a lado com um grupo de controle de camundongos normais.
Os camundongos resistentes à autofagia ficaram exaustos rapidamente.
Seus músculos pareciam incapazes de retirar açúcar do sangue como faziam
os camundongos normais.
Importância de manter-se ativo
A maior surpresa ocorreu quando Levine empanturrou os dois grupos,
durante várias semanas, com ração com alto teor de gordura, até que
desenvolvessem um tipo de diabetes de roedores. A corrida reverteu
posteriormente a condição de saúde dos camundongos normais, mesmo
enquanto continuavam recebendo a dieta rica em gordura.
Contudo, após correrem durante semanas, os camundongos resistentes à
autofagia permaneceram diabéticos. Os níveis de colesterol deles também
estavam mais altos que os dos outros camundongos. O exercício físico não
os tornou mais saudáveis.
Levine e seus colegas concluíram que o aumento da autofagia, induzido
pelos exercícios físicos, parece ser uma etapa decisiva na melhora das
condições de saúde.
A descoberta é "muito empolgante", afirmou Zhen Yan, do Centro de
Pesquisas Musculoesqueléticas da Universidade da Virgínia, que também
estuda autofagia e exercícios. Segundo Yan, o estudo "aprimora a nossa
compreensão das razões do impacto salutar dos exercícios sobre a saúde".
Os resultados obtidos por Levine têm implicações amplas. Por exemplo,
os indivíduos que não reagem aos exercícios aeróbicos com o mesmo vigor
que seus companheiros de treino podem ter sistemas de autofagia
instáveis ou inadequados.
"É muito difícil estudar a autofagia nos seres humanos", afirmou
Levine. Entretanto, medicamentos intensificadores de autofagia ou
exercícios especializados algum dia talvez ajudem as pessoas a obterem
total proveito dos exercícios físicos.
Até lá, esse estudo salienta mais uma vez a importância de permanecer
ativo. Tanto o grupo de controle quanto o grupo geneticamente modificado
tinham "níveis antecedentes normais de autofagia" durante as
circunstâncias diárias, observou Levine. Contudo, esse nível de base de
"limpeza" celular não foi suficiente para protegê-los em face de uma
dieta insatisfatória.
"Eu nunca pratiquei exercícios físicos de forma persistente", afirmou
Levine. Recentemente, porém, após ter testemunhado a contribuição dos
exercícios na "limpeza" das células dos camundongos corredores, a
cientista adquiriu uma esteira mecânica.
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